sábado, 17 de outubro de 2009

Sobre um ofício

Josephef Campbell, especialista em mitologia sempre encantou-me. Em O Poder do Mito, onde o referido autor concede a Bill Moyers uma entrevista sobre sua obra, existe uma passagem que traduz meu encantamento, quando Campbell relata uma cena de quando exercia o ofício de professor em uma escola preparatória para meninos e costumava instigar seus alunos sobre que carreira pretendiam seguir. Um dia um garoto aproximou-se do mestre e perguntou: " Você acha que eu posso fazer isto? Você acha que posso ser escritor?" Então Campbell lhe respondeu: " Ah, eu não sei. Você é capaz de suportar dez anos de frustrações, ninguém prestando atenção a você, ou você acha que vai escrever um best-seller logo na primeira tentativa? Se tem garra para perseverar no que realmente quer, não importa o que aconteça, então vá em frente." Então segundo Campbell aparecia o papai ou a mamãe e dizia:"Não você vai estudar Direito, porque oferece mais mais perspectiva financeira." Isto não era perseguir a bem-aventurança, Campebell lançava a questão: "Você pretende se dedicar à fortuna ou à bem-aventurança?" Cada dia mais a bem-aventurança é vista como algo de maluco, irresponsável, até lunático. Neste contexto emergente onde "ter é poder", aqueles que insistem em perseguir o que lhes dá paixão, lhes preenche a alma, parece que estão em um universo paralelo, outra dimensão. Claro que ir atrás daquilo em que acreditamos implica em constantes desafios, mas bem mais prazerosos visto que o objetivo final esta em uma realização realmente motivante. Ontem foi comemorado o dia do professor, este é um desafio em tanto para todos que optaram pela carreira, afinal professores travam todos os dias batalhas dignas de heróis da resistência. Resistimos á falta de valorização de nosso ofício, sempre me questiono o motivo que leva um médico, ou um advogado, ou outros profissionais com formação superior receberem mais, não compreendo. Estes dias estava na sala dos professores na hora do intervalo e resolvi dar uma lida no jornal do dia, estava a notícia, "presidente do Senado quer a aprovação do salário duplex". Segundo a matéria o referido político recebe a bagatela de 52 mil reais por mês e quer mais! Pensei comigo mesma, gostaria de ver alguns políticos passando pela experiência de serem professores, uma espécie de big brother escolar.. Imagina o presidente do senado e mais alguns selecionados, tendo a missão de sobreviver durante um ano como professores, trabalhando realmente. Confesso viajo por demais, mas imaginei o nobre senhor dentro de uma sala de oitava série, lutando para conseguir fazer a chamada, depois implorando pelos trabalhos que havia pedido quase um mês atrás, e tendo que paralisar sua oratória para separar um briga de garotas que se agarraram pelos cabelos... Quando dei por mim estava rindo sozinha, meus colegas de trabalho me olhavam sem nada entender, nem precisa. Resumindo toda esta ladainha é só para lembrar a importância que possui um professor, aquele que exerce com seriedade, com respeito e com amor o ofício escolhido. Uma espécie de homenagem a todos nós que buscamos não encher nossos alunos de conhecimentos mas acima de tudo que nos preocupamos em levá-los a reflexão, a consciência de que sigam o que lhes inspira paixão. Quando eu estava na oitava série tive um professor de português que passava sua paixão, nos contagiava em suas aulas, aquele era seu diferêncial, quando entrava na sala tudo assumia outra perspectiva. Bem como quando realizei minha graduação, a primeira aula que tive foi de História Antiga com o Doutor em História José Bento Rosa da Silva, professor brilhante, que em sua primeira aula conosco recitou o poema de Bertolt Brecht "Perguntas um operário que lê". O professor Bento como costumávamos chamá-lo nunca podava um aluno, por mais fora de contexto que a intervenção pudesse ser, o mestre sempre parava, colocava as mãos no queixo e dizia: " Podemos pensar nisto que você falou"... Nunca desprezou ou calou um aluno, e ao longo da graduação era nítida a diferença que isto fazia, este é o exemplo do mestre que exerce com paixão o ofício que escolheu. Ironia do destino ou não, enquanto estou terminando esta crônica na tv esta passando uma reportagem , acabei de ouvir o relato de uma professora de história afastada por depressão motivada pela violência sofrida em seu cotidiano, tendo que lidar com ameaças, e agressões, sonha em voltar a dar aulas, mas não sabe quando... Este mês completaram-se treze anos sem Renato Russo e ainda o questionamento é o mesmo: "Que país é esse"?

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