domingo, 27 de setembro de 2009

Crônicas de Sala de Aula; a história de Judith

Entrei naquela sala de sétima série pronta para mais uma aula, o tema em questão era Imperialismo na África e na Ásia.
Comecei a dissertar sobre tal questão, mas meus ouvintes não estavam nem aí, foi então que resolvi fazer uma pergunta:
_ Vocês conhecem a história de Judith?
Como eu esperava ninguém assentou com a cabeça que sim.
Bem, prossegui, vou contar esta história para vocês.
O silêncio antes tão difícil de conseguir agora reinava absoluto, nada mais útil do que atiçar a curiosidade através de uma boa história.
Judith era uma menina de seis anos, vivia nos EUA, durante o período em que ainda vigorava neste país a segregação racial.
Logo após o fim da guerra civil americana em 1865, alguns estados passaram a legalizar esta prática, que perdurou até o ano de 1964.
Acontece que lá pela década de sessenta esta menina foi a primeira negra a ser autorizada a freqüentar uma escola exclusivamente para brancos.
Quando a pequena Judith chegou, a escola estava vazia, foi recebida pela professora, na sala apenas ela e a professora, quando bateu sinal do recreio Judith sentou-se em um banco do enorme pátio, abriu sua lancheira e saboreou o que sua mãe havia lhe preparado.
Assim à tarde seguiu, professora e aluna cumpriram as tarefas escolares, a garotinha aprendeu, encontrou as letras que tanto deseja para finalmente escrever seu nome fez um desenho onde vários rabiscos representando pessoas davam as mãos.
Finalmente o sinal bateu, a professora ajudou Judith arrumar suas coisas, deu a mão para a menina e a conduziu até o portão da saída.
Antes, porém ajoelhou-se e disse:
_ Judith você gostou de seu primeiro dia de aula?
A menina respondeu:
_ Sim eu gostei, mas para onde foram todas as outras crianças, todos os dias vão ser assim, só eu nesta escola tão grande!
A professora procurando preparar a garota para o que viria a seguir calmamente falou:
_ Minha menina, não, você vai ver que nem sempre vai ser assim, mas para que as coisas mudem e seus amiginhos voltem vai me prometer que quando este portão abrir, não importa o que aconteça você vai seguir de cabeça erguida, olhando para frente, sua mãe vai estar lá esperando, apenas siga sem olhar para os lados, enxergue apenas o olhar de sua mãe e procure cantar aquela musiquinha que lhe ensinei hoje, ouça apenas a sua música!
O portão abriu-se, e um corredor estreito era o que Judith tinha para caminhar, dos dois lados havia uma multidão, estavam ali as crianças brancas com seus pais, todos gritando, insultando, mas a pequena menina de seis anos cumpriu o que prometeu a professora, ergueu a cabeça, começou a cantar a musiquinha e fixou o olhar nos olhos de sua mãe.
Assim naquele dia Judith entraria para a história como a primeira criança negra a ter o direito de estudar em uma escola de brancos.
A mãe a esperava de braços abertos pegou a filha no colo e seguiu afastando-se da multidão.
Ao terminar a história procurei salientar aos meus alunos que o racismo originou-se das teorias raciais lá por volta do século XIX, onde cientistas através de vários estudos afirmavam a superioridade de uma raça sobre outra, ou seja, que havia grupos humanos superiores aos demais.
Falei que mais tarde quando os países europeus iniciaram seu processo de colonização, necessitavam de mão-de-obra barata, melhor ainda se fosse de graça.
Então recorreram aos ideais gregos de perfeição e as tais teorias raciais do século XIX, acrescentaram mais um ingrediente, a questão da cor, pronto estava justificada a escravidão e disseminada a discriminação.
Confesso que hoje me causa enorme repulsa quando ouço pessoas ainda falando nesta questão de “raça”, vez por outra escuto especialistas, mestres, enfim cidadãos ainda insistindo em classificar as pessoas dentro de uma categoria racial.
Penso que existe uma única raça em nosso planeta, a “raça humana”, somos todos da mesma raça, persistir seguindo preceitos formulados em outro momento histórico é algo inconcebível.
Aproveitei a mesma aula para discutir um pouco sobre as várias roupagens em que o preconceito se traveste.
Por exemplo, o preconceito em relação ás opções sexuais de cada um, ou o preconceito com pessoas tatuadas que ainda existe, ou preconceito quanto à religiosidade.
Com certeza não devemos categorizar, julgar, pois em todos os segmentos de uma sociedade vamos encontrar pessoas que valem á pena e aquelas que não valem.
Isso é uma questão de caráter, de uma série de valores pessoais forjados ao longo das experiências pelas quais passamos. Uma opção em oposição à velha mediocridade.
Enquanto seguirmos o caminho do gado, enquanto não atingirmos uma consciência mais elevada, vamos continuar reafirmando teorias forjadas a ferro e fogo ao longo do contínuo processo histórico e tudo atestado cientificamente.
O sinal bateu, para que série mesmo vou agora?

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